ANEMIA PRÉ-OPERATÓRIA COMO FACTOR PREDICTOR DE MORBILIDADE — ANÁLISE RETROSPECTIVA DE UM DEPARTAMENTO DE CIRURGIA VASCULAR
DOI:
https://doi.org/10.48750/acv.253Palavras-chave:
Anemia pré-operatória, Suplementação com ferro oral e endovenoso, Patient blood management, Cirurgia vascularResumo
Introdução: A anemia está associada a um aumento do número de eventos adversos no período pós-operatório precoce devido ao elevado stress fisiológico e aumento das necessidades cardíacas. O objetivo do presente estudo foi avaliar a relação entre a presença de anemia pré-operatória com os outcomes de morbi-mortalidade em doentes submetidos a cirurgia vascular electiva, nomeadamente endarterectomia carotídea, reparação cirúrgica de aneurisma da aorta abdominal, reparação endovascular de aneurisma da aorta abdominal (EVAR) e bypass infra-inguinal por isquemia crónica.
Métodos: Análise retrospectiva de todos os doentes intervencionados entre 2016 a 2018 a: endarterectomia carotídea, reparação cirúrgica de aneurisma da aorta abdominal, EVAR e bypass infra-inguinal por isquemia crónica. Foram excluídos todos os procedimentos realizados em contexto de urgência e aqueles com necessidade transfusional superior a 4 unidades de glóbulos rubros. Os níveis de hemboglobina foram categorizados de acordo com a definição da OMS para anemia: grave (< 8 g/dL), moderada (8-10,9 g/dL), ligeira (11-11,9 g/dL no sexo feminino; 11-12,9 g/dL no sexo masculino) e ausência de anemia (≥12 g/dL no sexo feminino e ≥13 g/dL no sexo masculino).
Resultados: A população estudada incluiu 257 doentes, 74 (28%) dos quais foram submetidos a EVAR, 26 (10,1%) a reparação cirúrgica de AAA, 67 (26,1%) a endarterectomia carotídea e 90 (35%) a bypass infra-inguinal. A anemia pré-operatória foi identificada em 37,4% (n = 96) dos doentes. Destes, 67,7% (n = 65) apresentavam anemia ligeira e 32,3% (n = 31) tinham uma anemia moderada-grave. Os doentes anémicos apresentam um total de dias de internamento mais prolongado em comparação com aqueles sem anemia (16,61±16,5; 7,68±4,92, respectivamente) (p = 0,022), bem como um internamento mais prolongado na Unidade de Cuidados Pós-Anestésicos comparativamente aos doentes com hemoglobina dentro dos valores normais (2,08 dias ± 1,12; 1,77 dias ± 1,01, respectivamente) (p<0,001). A existência de anemia pré-operatória associou-se com o aumento das necessidades transfusionais peri-operatórias (p<0,001), tal como expectável. A ocorrência de eventos adversos foi influenciada pela presença de anemia (p<0,001), nomeadamente infecção da ferida operatória (p = 0,002) e re-intervenção (p<0,007). Os doentes com necessidade de suporte transfusional peri-operatório tiveram uma tendência para a ocorrência de um maior número de eventos adversos (p<0,001), tais como lesão renal aguda (p = 0,006), infecções do tracto respiratório (p =0,015), infecção da ferida operatória (p = 0,001) e re-intervenção (p = 0,001).
Conclusão: O estudo da anemia deverá ser incorporado na avaliação do risco pré-operatório. A anemia por deficiência de ferro é o tipo mais comum de anemia. Nesta situação, a suplementação com ferro oral ou endovenoso no período pré-operatório é o tratamento preferencial, que poderá inclusive diminuir as necessidades transfusionais. Os doentes que apresentem ferropenia sem anemia, também têm indicação formal para iniciar suplementação de ferro. Estes resultados corroboram a necessidade de implementação de um programa bem estruturado, que vise a optimização da hemoglobina e do ferro no período pré-operatório, redução das perdas de sangue intra-operatórias e melhoria do status do doente anémico com o objetivo comum de atingir outcomes mais favoráveis.
Downloads
Referências
2. McMillan, M.T., et al., Risk-adjusted Outcomes of Clinically Relevant Pancreatic Fistula Following Pancreatoduodenectomy: A Model for Performance Evaluation. Ann Surg, 2016. 264(2): p. 344-52.
3. DeMatteo, R.P., et al., Long-term results of adjuvant imatinib mesylate in localized, high-risk, primary gastrointestinal stromal tumor: ACOSOG Z9000 (Alliance) intergroup phase 2 trial. Ann Surg, 2013. 258(3): p. 422-9.
4. Dakour-Aridi, H., et al., Anemia and postoperative outcomes after open and endovascular repair of intact abdominal aortic aneurysms. J Vasc Surg, 2019. 69(3): p. 738-751 e2.
5. Cotton, B.A., et al., A randomized controlled pilot trial of modified whole blood versus component therapy in severely injured patients requiring large volume transfusions. Ann Surg, 2013. 258(4): p. 527-32; discussion 532-3.
6. Nutritional anaemias. Report of a WHO scientific group. World Health Organ Tech Rep Ser, 1968. 405: p. 5-37.
7. Obi, A.T., et al., The association of perioperative transfusion with 30-day morbidity and mortality in patients undergoing major vascular surgery. J Vasc Surg, 2015. 61(4): p. 1000-9 e1.
8. Leahy, M.F., et al., A pragmatic approach to embedding patient blood management in a tertiary hospital. Transfusion, 2014. 54(4): p. 1133-45.
9. Gupta, P.K., et al., Preoperative anemia is an independent predictor of postoperative mortality and adverse cardiac events in elderly patients undergoing elective vascular operations. Ann Surg, 2013. 258(6): p. 1096-102.
10. Trentino, K.M., et al., Associations of nadir haemoglobin level and red blood cell transfusion with mortality and length of stay in surgical specialties: a retrospective cohort study. Anaesthesia, 2019. 74(6): p. 726-734.
11. Bernard, A.C., et al., Intraoperative transfusion of 1 U to 2 U packed red blood cells is associated with increased 30-day mortality, surgical-site infection, pneumonia, and sepsis in general surgery patients. J Am Coll Surg, 2009. 208(5): p. 931-7, 937 e1-2; discussion 938-9.
12. O'Keeffe, S.D., et al., Blood transfusion is associated with increased morbidity and mortality after lower extremity revascularization. J Vasc Surg, 2010. 51(3): p. 616-21, 621 e1-3.
13. Spahn, D.R., Patient Blood Management: Success and Potential in the Future. Ann Surg, 2016. 264(2): p. 212-3.
14. Task Force on Patient Blood Management for Adult Cardiac Surgery of the European Association for Cardio-Thoracic, S., et al., 2017 EACTS/EACTA Guidelines on patient blood management for adult cardiac surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth, 2018. 32(1): p. 88-120.