O IMPACTO DA SARS-COV-2 NA ACTIVIDADE CIRÚRGICA VASCULAR NUM HOSPITAL TERCIÁRIO
DOI:
https://doi.org/10.48750/acv.342Palavras-chave:
COVID-19, Cirurgia Vascular, OutcomesResumo
Introdução: A doença do coronavírus de 2019 (COVID-19) e consequente período de confinamento teve um impacto significativo no sistema nacional de saúde, com restrições em toda a actividade clínica — actividade assistencial na consulta, exames complementares de diagnóstico e número e tipo de intervenções cirúrgicas. A apreensão dos doentes em recorrer aos cuidados médicos e aos hospitais levou a admissões tardias, e na nossa percepção, a apresentações mais graves da patologia de base, nomeadamente na Isquémia Crítica de Membro (ICM). A necessidade de testar os doentes previamente a uma cirurgia não-emergente aumentou o tempo de referenciação inter- e intra-hospitalar, o que, somando à diminuição dos tempos cirúrgicos e da disponibilidade de vagas em unidades de cuidados intensivos, potencialmente prejudicou os resultados. O objectivo deste estudo é avaliar objetivamente o tipo de patologia que foi tratado durante o estado de emergência e comparar o desfecho dos procedimentos cirúrgicos com o mesmo período em 2018 e 2019.
Métodos: Foi realizada uma análise retrospectiva dos processos clínicos dos doentes submetidos a cirurgia nos meses de Março e Abril do ano de 2020 e foi feita a comparação com o mesmo período dos dois anos prévios. O endpoint primário foi mortalidade aos 30 dias ou intra-hospitalar. Os endpoints secundários foram classificação patológica e do grau de isquémia, taxa de amputação, nível de amputação, tipo de cirurgia (aberta, endovascular ou híbrida), tempo de internamento e re-intervenção.
Resultados: Foram operados 98 doentes no Período COVID (PC) comparado com 286 no Período Não-COVID (PNC). Não houve diferenças estatisticamente significativas na idade (70 anos (17–98) no PC vs. 69 (17–92) no PNC, p=.13) ou sexo dos doentes operados (76% masculino (n=74) no PC vs. 70% (n=196) no PNC, p=.26). Também não houve diferença estatisticamente significativa na mortalidade (5% (n=5) no PC vs. 5% (n=13) no PNC, p=.88). Houve uma diminuição estatisticamente significativa da cirurgia aberta (43% (n=42) no PC vs. 57% (n=164) no PNC, p=.04). Não houve diferenças significativas no tempo de internamento hospitalar (10 (0–77) dias no PC vs. 7 (0–118) no PNC, p=.6) e na taxa de re-intervenção (18% (n=18) no PC vs. 16% (n=45) no PNC, p=.58). A Doença Arterial Periférica (DAP) correspondeu a 75% (n=73) das admissões no PC, vs. 48% (n=137) no grupo PNC (p=.02). A ICM correspondeu a 99% (n=70) das admissões por DAP no PC, vs. 93% (n=114) no PNC (p=.1), com um aumento significativo da proporção de doentes cuja apresentação na admissão foi de grau 5 ou 6 de Rutherford (81% (n=57) vs. 68% (n=77), p=.03). Houve ainda uma diminuição sem significado estatístico da taxa de amputação (35% (n=25) no PC vs. 40% (n=49) no PNC, p=.49) com um aumento não significativo da taxa de amputação major (52% (n=13) no PC vs. 39% (n=19) no PNC, p=.27). O segundo grupo de patologia mais tratado foi a doença aneurismática da aorta e artérias ilíacas, mas houve uma diminuição estatisticamente significativa do número de doentes tratados (5% (n=5) no PC vs. 13% (n=36) no PNC, p=.05). Todos os aneurismas da aorta tratados durante o PC estavam em rotura (100% (n=5) vs. 42% (n=15) in the NCP, p=0.2). Não houve diferenças significativas entre os grupos na mortalidade por reparação urgente de aneurismas (60% (n=3) no PC vs. 47% (n=7) no PNC, p=.77).
Conclusão: As restrições impostas pela COVID-19 manifestaram-se principalmente no tipo de patologia tratado e no número de doentes operados. A apresentação mais grave da patologia de base, manifestada por graus de isquémia crítica mais avançados, não aumentou a mortalidade nem se reflectiu de forma significativa nas taxas de amputação. A doença aneurismática da aorta foi a segunda patologia mais tratada, mas com uma diminuição significativa do número total de casos, sem diferença significativa na mortalidade.
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